O blog Conceitos Táticos, como o próprio nome entrega, visa abordar os conceitos táticos no mundo do futebol. Meu objetivo é analisar, provocar, fazer pensar, discutir e tirar dúvidas sobre o assunto. Estou sempre aberto a opiniões, sugestões, críticas, perguntas, discordâncias e etc.

sexta-feira, 22 de março de 2013

O São Paulo de Telê Campeão do Mundo de 1992


            Tendo em vista as más atuações recentes do São Paulo e a pressão recaindo sobre o técnico, Ney Franco, além das críticas pelas fracas atuações de Ganso, coloquei-me a pensar sobre como seria escalado o time se o técnico fosse outro. Com isso na cabeça, fui pesquisar como jogava o São Paulo campeão do mundo de 1992, sob a batuta de Telê Santana.
            Cabe ressaltar que a análise atual se baseia em apenas uma partida, sendo assim pode não condizer com a maneira como o time jogava de modo geral na época.

A formação do São Paulo campeão do Mundo de 1992

            A equipe atuava no 4-3-2-1, variável de acordo com o posicionamento e movimentação de Raí e Palinha, os dois meias. Palinha por muitas vezes se alinhava aos volantes, formando uma linha de quatro no meio, enquanto Raí encostava em Muller, formando a dupla de ataque. A marcação era feita quase sempre a partir da linha central do campo, porém com bastante intensidade sempre que o Barcelona ultrapassava a linha, tendo quase sempre oito atletas atrás da linha da bola. A marcação era bem executada e articulada, dificultando o progresso da equipe adversária.

A linha de três volantes e logo à frente os dois meias. Muita intensidade e pouco espaço para a equipe adversária no campo defensivo do São Paulo.

Palhinha retorna formando uma linha de quatro com os volantes, enquanto Raí fica na frente com Muller.

            Com a bola, o São Paulo apostava na transição em velocidade ou no contra-ataque, raramente valorizando a posse de bola. A equipe abusava de bolas longas, principalmente de Palinha e Cerezo, quase sempre procurando Muller, referência de velocidade que não ocupava em hipótese alguma a intermediária ofensiva. Mesmo jogando na referência, Muller não era centroavante, jogando mais pelos lados e abrindo espaço principalmente para Raí, que alternava os papéis de ponta de lança e centroavante.

Situação de contra-ataque: bola longa para Muller (que não retornava nunca para o campo defensivo) e projeção  rápida de Raí e Palhinha, praticamente um 4-3-3.

Muller era referência móvel, alvo dos lançamentos de Cerezo e Palhinha pela esquerda, enquanto Raí muitas vezes se portava como o centroavante da equipe, como na situação que gerou o primeiro gol (diga-se de passagem em jogada espetacular de Muller)

            Quando o time ficava mais com a bola, Cafu, Cerezo e esporadicamente um dos laterais tinham mais liberdade para sair para o jogo, enquanto Pintado ficava mais plantado atrás, junto com os zagueiros e o lateral oposto.
            Não foi necessariamente uma exibição de futebol-arte como a seleção de Telê dos anos 80, porém o sistema defensivo esteve muito bem articulado, marcando de forma intensa e bem organizada. Na frente a velocidade das transições e o fator Raí fizeram a diferença.

O 4-2-3-1 do São Paulo, mutante de acordo com o comportamento de Palhinha, que recuava  formando uma linha de quatro com os volantes e de Raí, que formava uma dupla de ataque com Muller.

            Ganso diz se inspirar em Raí, e realmente tem algumas características semelhantes, como a técnica refinada. Ney Franco poderia se inspirar na maneira que o São Paulo de Telê jogava e deixar Ganso mais à frente, próximo de Luis Fabiano e sem tanta obrigação defensiva, prendendo mais Jadson junto aos volantes qualificando o passe de trás e Oswaldo fazendo uma função semelhante à de Palhinha, voltando para compor a linha do meio de campo sem bola e projetando-se em velocidade com a posse. A maior diferença seria que enquanto Muller era uma referência de velocidade, Luis Fabiano é finalizador, sendo assim Ganso poderia recuar mais para armar com a bola do que Raí fazia.

Caso Ney Franco se inspirasse em Telê Santana: Jadson mais contido perto dos volantes, qualificando a saída de bola, inclusive com lançamentos longos, Oswaldo fechando a linha de quatro no meio e chegando no ataque, Ganso com menos obrigações defensivas e liberdade para armar o time.

sexta-feira, 1 de março de 2013

A Leitura de Jogo e a Tomada de Decisões nas Ações Ofensivas


           O futebol pode ser classificado como uma modalidade esportiva coletiva de ambiente aberto, ou seja, todas as ações realizadas pelos atletas em campo dependem de uma série incontável de fatores, como posicionamento e movimentação dos colegas e adversários, placar do jogo, tamanho e qualidade do campo, entre tanto outros. Diferentemente por exemplo de uma prova de natação, em que o atleta nada dentro da sua raia uma distância pré-determinada sem receber interferências externas.
            No caso do futebol, uma jogada nunca é exatamente igual à outra. Situações de jogo podem ser treinadas à exaustão, porém no momento do jogo nunca sabemos realmente o que acontecerá. Uma movimentação do zagueiro adversário diferente do imaginado já muda totalmente o contexto do jogo. Tendo isso em vista, é fundamental que os atletas sejam treinados para conseguir ler essas situações e tomar decisões em cima disso. A imprevisibilidade é inerente ao jogo.
            Um exemplo básico de situação comum de jogo e as várias opções que o atleta tem no momento: o ponta direita chega à linha de fundo com a bola dominada. Ele pode cruzar na área uma bola alta, rasteira, rasante; no primeiro ou no segundo pau; ele pode tocar para trás; conduzir a bola em direção ao gol; segurar a bola ali esperando a aproximação de um companheiro. Repare como em uma situação simples de jogo o atleta tem diversas possibilidades. A melhor decisão não é uma resposta exata. Tudo depende da movimentação de colegas e defensores, se o time está ganhando ou perdendo, das características dos jogadores... em uma fração de segundos o atleta deve levar tudo isso em consideração na tomada da decisão.
            Cabe ao treinador criar situações e estratégias de treino para instigar nos atletas a capacidade de percepção e criatividade dentro de um modelo de jogo pré-estabelecido. Deve-se sempre ter em mente a pergunta: “qual a melhor opção para a situação que se apresenta agora?”.
            Nas figuras abaixo temos alguns exemplos de jogadas em que os atletas souberam ter leitura de jogo e tiraram proveito disso para o sucesso na execução da jogada. Mesmo em situações pré-estabelecidas e bem assimiladas (por exemplo, passe do Ronaldinho e infiltração do Bernard na diagonal a partir da esquerda) há nuances que são rapidamente percebidos e que geraram a situação de gol.

Repare aqui no sentido da bola e no sentido do Bernard. Percebendo que o zagueiro ia cortar o passe, ele não vai em direção à bola, mas sim na direção do zagueiro, que cortou o passe e praticamente dominou a bola para finalização do Bernard.

Após bola rebatida, Bernard, percebendo que estava em posição de impedimento, recua rapidamente enquanto Jô se projeta para o espaço vazio em posição legal.

Em posição de impedimento, Bernard rapidamente recua para ficar em posição legal e já dispara novamente para dentro da área. Percebendo sua movimentação, Ronaldinho dá o passe no momento certo.

Em uma transição de velocidade, Pato age com calma enquanto o time inteiro do Palmeiras volta o mais rápido possível desordenadamente (entram oito defensores na área e nenhum fica na região da meia lua). Romarinho se projeta no espaço vazio e Pato faz o passe para Romarinho.