O blog Conceitos Táticos, como o próprio nome entrega, visa abordar os conceitos táticos no mundo do futebol. Meu objetivo é analisar, provocar, fazer pensar, discutir e tirar dúvidas sobre o assunto. Estou sempre aberto a opiniões, sugestões, críticas, perguntas, discordâncias e etc.

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

É Possível Abdicar dos “Cães de Guarda”?

              Cada vez mais as grandes equipes e seleções, principalmente da Europa, têm buscado colocar em campo mais atletas com capacidade técnica de participar efetivamente de ações ofensivas da equipe. E isso implica, entre outros, ter volantes que saibam jogar com a bola nos pés.
            Aqui nesse espaço já foram destacadas algumas situações nesse sentido: o comportamento de Pirlo no Milan campeão da UCL 2006/07, no Juventus atual e na Itália na última Eurocopa; o comportamento dos volantes da seleção alemã na última Eurocopa (situação semelhante é observada no Real Madrid, porém de uma forma um pouco mais conservadora); os aspectos teóricos dos conceitos defensivos, em que na marcação por zona há uma divisão equilibrada de espaços ocupados e funções.
O comportamento de Pirlo nas equipes em que joga e da seleção alemã, com uma dupla de volantes com iguais funções defensivas e ofensivas. Dois dos exemplos já citados aqui no blog sobre a ausência de um "cão de guarda".
               Dentre as grandes equipes européias, quase não vejo casos da utilização no time considerado titular de um volante que tem como funções únicas a marcação e a cobertura defensiva. Algumas equipes contam com uma dupla de volantes que têm iguais responsabilidades defensivas e ofensivas (como por exemplo o Real Madrid e a seleção alemã, como destacado acima), e outras contam com um primeiro volante com qualidade no passe e certa liberdade para chegar à frente (como por exemplo Sergio Busquets no Barcelona e na seleção espanhola).
            Aqui no Brasil já é mais comum a escalação de um primeiro volante que tem basicamente apenas funções defensivas, e isso se deve principalmente ao comportamento dos laterais: enquanto na Europa os laterais ocupam quase o tempo inteiro a linha de defesa, raramente subindo para o campo ofensivo, no Brasil temos tradicionalmente laterais fortes no apoio, o que naturalmente deixa mais espaços no setor defensivo. Para compensar esse espaço deixado por laterais, os treinadores brasileiros optam por escalar um volante exclusivamente marcador, que tem como função principal realizar a cobertura desses laterais.
            Apesar dessa tradição, porém, cada vez mais equipes brasileiras também contam com volantes capacitados nas ações ofensivas. Das quatro equipes paulistas, apenas o Santos conta hoje com um volante mais marcador (Adriano), mas vale lembrar que o Santos campeão da Libertadores contou com Henrique na equipe titular. Com o excessivo número de lesões e algumas mudanças na equipe, não dá para saber se, com o time completo, Muricy ainda manteria Henrique como primeiro volante. Apesar de ser zagueiro, Henrique tem boa atuação no aspecto ofensivo no Palmeiras. Ralf, no Corinthians e Denílson, no São Paulo, têm bom passe e participam ativamente das ações ofensivas de suas equipes.
            Das três equipes melhores colocadas no campeonato brasileiro atualmente, duas usam um primeiro volante exclusivamente marcador (Edinho no Fluminense e Pierre no Atlético-MG), mas isso se deve principalmente, como dito acima à grande vocação ofensiva de seus laterais. Já o Grêmio conta com um primeiro volante com grandes qualidades tanto defensivas quanto ofensivas, o jovem Fernando, que joga como veterano.

Fernando, Denílson, Henrique e Ralf: exemplos de primeiros volantes que participam com qualidade das ações ofensivas de suas equipes.
            A opção por escalar um volante exclusivamente para funções defensivas é simplista: é mais fácil colocar alguém que faça essa cobertura que cobrar dos atletas (tantos laterais quanto volantes) consciência tática, leitura e percepção de ocupação de espaços (quando subir, quando voltar, aonde ir). As equipes brasileiras poderiam aproveitar tanto o poderio ofensivo de seus laterais quanto a qualidade técnica de seus volantes, a fim de ter em campo um maior número de jogadores tecnicamente qualificados. Tendo inserido neles a leitura de jogo e a percepção de que a participação ativa de todos tanto do ponto de vista ofensivo quanto do defensivo torna-se possível colocar os melhores em campo.