O blog Conceitos Táticos, como o próprio nome entrega, visa abordar os conceitos táticos no mundo do futebol. Meu objetivo é analisar, provocar, fazer pensar, discutir e tirar dúvidas sobre o assunto. Estou sempre aberto a opiniões, sugestões, críticas, perguntas, discordâncias e etc.

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Seleção do Campeonato Brasileiro 2013

Antes de qualquer coisa, julgo fundamental deixar claro que a seleção não se refere aos melhores do país, ou do ano, e sim da competição, logo, deixei de fora atletas que considero melhores que os que incluí, porém que na minha leitura não fizeram um campeonato tão bom. E, lógico, discordâncias são naturais, desde que providas de respeito.



-Goleiro: Fábio (Cruzeiro): O Brasil tem outros grandes goleiros, como Diego Cavallieri, Jefferson e Vitor (que fez uma excelente Libertadores pelo Atlético-MG), mas no campeonato o destaque fica com Fábio, o goleiro campeão, que tem sua parcela de responsabilidade com grandes defesas e exercendo sua liderança sobre o time.

-Lateral-Direito: Ceará (Cruzeiro): Seria o lateral-base da equipe. Desbancou a concorrência do bom jovem Mayke na equipe pelo papel tático, mas também sabe ajudar na saída de bola e descer ao ataque com bons passes e cruzamentos quando necessário.

-Zagueiro: Gil (Corinthians): Um dos grandes responsáveis pelo “empatite”. Quando o adversário conseguia superar a boa marcação armada pelo Tite, se deparava com Gil como último homem, fazendo cortes precisos.

-Zagueiro: Dedé (Cruzeiro): após um início hesitante, foi firmando-se e relembrando a boa fase dos tempos de Vasco. É o zagueiro com mais desarmes na competição.

-Lateral-esquerdo: Alex Telles (Grêmio):  O jovem lateral (prestes a completar 21 anos) destacou-se no campeonato pela qualidade no apoio, com cruzamentos e fortes chutes de fora da área. Seria o lateral apoiador da equipe.

-Volante: Rodrigo Caio (São Paulo): O símbolo da reestruturação da equipe com a chegada de Muricy Ramalho, pode jogar tanto como volante quanto como zagueiro. Com boa leitura, pode inclusive alternar as funções dentro de uma mesma partida, inclusive recuando para a linha dos zagueiros com o intuito de qualificar a saída de bola.

 -Volante: Elias (Flamengo):  O “motorzinho” da equipe carioca, auxiliando na marcação e ainda sendo o principal responsável pela armação de jogadas. Suas principais partidas e gols mais importantes ocorreram na Copa do Brasil, mas fez também um bom campeonato brasileiro.

-Meia-atacante: Éverton Ribeiro (Cruzeiro): Dito por muitos como o craque do campeonato, caiu como uma luva na equipe celeste, alternando de posição com os outros meias com frequência e protagonizando boas arrancadas, principalmente em diagonal.

-Meia-atacante: Marcelo (Atlético-PR): unindo velocidade, habilidade e grande qualidade técnica, principalmente pela direita do ataque, grande responsável por “desafogar” a equipe, recebendo lançamentos de longa distância e puxando contra-ataques. Sempre motivo de preocupação para defesas adversárias.

-Meia-atacante: Rafael Marques (Botafogo): Outrora criticado, foi, ao lado de Seedorf, um dos grandes responsáveis pela boa campanha botafoguense na competição. Podendo executar diversas funções em campo, foi o “curinga” ofensivo da equipe, sendo fundamental nas ações ofensivas e ainda auxiliando na marcação.

-Centroavante: Walter (Goiás): Fundamental na campanha do Goiás na competição, o “gordinho” é capaz de realizar as diversas funções de um centroavante: finalizar, segurar a bola, servir de parede e ainda abrir espaços para os atacantes que vêm de trás.


-Técnico: Marcelo Oliveira (Cruzeiro): Montou, junto á diretoria, a equipe campeã. Após boas campanhas com o Coritiba (que bateu  na trava duas vezes na Copa do Brasil), dessa vez foi feliz com a conquista do título. Uma equipe leve e dinâmica, que priorizou o ataque, e não dependeu exclusivamente de nenhum jogador. 

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

As Variações Táticas do Palmeiras na Série B

O Palmeiras vem cumprindo sua obrigação e garantindo seu acesso para o ano do centenário sem grandes sobressaltos, liderando praticamente o campeonato inteiro. Para atingir seus objetivos, Gilson Kleina tem variado o desenho tático da equipe de acordo com desfalques e situações de jogo.

Ele tem se apoiado em basicamente três desenhos táticos, que, no comportamento defensivo, reduzem-se a dois. Ora ele utiliza três volantes, tendo um meia armador e dois atacantes, ora ele utiliza dois volantes, tendo dois meias armadores e dois atacantes ou um meia armador e três atacantes. Importante ressaltar que o comportamento do time não altera devido ao número de volantes escalados, ou seja, não fica mais defensivo ou mais ofensivo, como muita gente gosta de pensar.

O Palmeiras vem garantindo tranquilamente o acesso para a série A no ano do centenário.
Quando utiliza três volantes, Marcio Araujo fica mais preso na frente dos zagueiros, enquanto Wesley e Charles têm mais liberdade para chegar á frente, com arrancadas, infiltrações por dentro, passes e finalizações. Valdívia fica solto para armar o time, Leandro e Alan Kardec jogam por dentro, enquanto os laterais Luis Felipe e Juninho são os responsáveis por dar amplitude e profundidade* ao time.  Em alguns momentos, Wesley (principalmente pela esquerda), Valdívia e Leandro (pelos dois lados), também se aproximam da linha lateral, dando amplitude ao time e fazendo parceria com Juninho e Luis Felipe. Charles joga mas centralizado. Alan Kardec é a referência, mas não se limita a ficar parado dentro da área. Ele recua por dentro, procurando fazer a parede e muitas vezes achar passes em profundidade para os companheiros.

Comportamento ofensivo com 3 volantes: Valdívia solto, Wesley e Charles fazendo infiltrações por dentro e Luis Felipe e Juninho responsáveis pela amplitude e profundidade da equipe.
Defensivamente, os três volantes marcam por dentro, enquanto Leandro e Alan Kardec procuram bloquear a saída de bola pelas laterais. Valdívia fica mais solto na frente. Pressiona o primeiro passe do volante adversário, mas assim que é batido não se preocupa com o retorno, descansando para efetuar as ações ofensivas.

Sem a bola, os volantes marcam por dentro, Leandro e Kardec bloqueiam a saída pelas laterais e Valdívia dá combate no primeiro passe, descansando depois que é batido.
Quando entra com dois volantes, Gilson Kleina coloca Mandieta para armar ao lado de Valdívia ou um terceiro atacante (normalmente Vinícius).  Quando joga Mandieta, ele atua aberto pela direita, mas centralizando para aproveitar os espaços deixados pela marcação, mais preocupada com Valdívia, e armar o time.  Leandro parte da esquerda para a área, fazendo dupla com Kardec, Wesley sobe mais esporadicamente que quando tem Charles ao seu lado, e os laterais seguem sendo a principal fonte de amplitude e profundidade do time.

Com Mandieta em campo: com a bola, ele centraliza para armar no espaço deixado pela marcação, mais preocupada com Valdívia, e Leandro forma dupla com Kardec no ataque. Sem a bola, Mandieta e Leandro bloqueiam a saída pela lateral, enquanto Kardec e Valdívia dão o primeiro combate pelo meio.
Quando usa três atacantes, Valdívia novamente se isola na armação. Pela direita, Leandro procura a diagonal, fazendo dupla com Kardec e abrindo o corredor lateral para Luis Felipe. Pela esquerda, Vinicius procura o fundo, sendo a principal opção de profundidade.  O time descentraliza um pouco suas ações ofensivas, procurando parcerias pelos lados (Leandro-Valdívia-Luis Felipe ou Vinícius-Wesley-Juninho) ou armando o jogo por dentro (Valdívia-Wesley-Kardec).

Os atacantes pelos lados garantem maior amplitude e profundidade sem depender tanto dos laterais, que continuam subindo bastante, dessa vez para formar parcerias com o atacante do seu lado e um dos meias.
Defensivamente, Leandro e Vinícius (ou Mandieta) recompõem pelos lados, e Valdívia e, principalmente, Kardec combatem a saída de bola pelo meio. Por vezes, Kardec recompõe por um dos lados, cobrindo um dos atacantes, dando tempo para que ele recupere o fôlego após alguma ação ofensiva.

Quando está vencendo e sendo pressionado, normalmente Gilson Kleina coloca Eguren em campo, formando duas linhas de quatro bem próximas, com o intuito de segurar o resultado e garantir a vitória.

Quando está ganhando e sendo pressionado, Eguren entra para jogar ao lado de Marcio Araujo. Uma linha de quatro é formada na frente da defesa, enquanto no ataque normalmente entra Serginho ou Ananias para re-oxigenar a busca pelo contra-ataque definitivo.
A equipe do Palmeiras é agressiva e vertical, porém por vezes peca em não saber segurar a bola e fazê-la girar. Quando consegue virar o jogo, a jogada termina do outro lado. Raramente a bola sai de um lado para outro e depois volta no mesmo lance. Isso seria fundamental principalmente contra defesas mais fechadas (o que acontece em praticamente todas as partidas da série B). Essa falta de paciência com a bola tem reflexo também no sistema defensivo: ao perder em demasia a bola, a equipe expõe a última linha defensiva, que apresenta falhas de posicionamento e cobertura que uma equipe de primeiro nível não pode cometer, e isso passa mais por treino e ações do treinador que por falhas individuais propriamente ditas. O Palmeiras tem boa produção ofensiva, porém sofre mais gols e mais derrotas que o aceitável para o nível do campeonato disputado.

O elenco atual está dando para o gasto para a disputa da série B, porém, se quiser sonhar com algo no ano do centenário é de fundamental importância que consiga reforços pontuais, que cheguem para ser titular. A manutenção do elenco (inclusive Kardec), com dois ou três atletas que cheguem para vestir a camisa e sair jogando, a meu ver, bastam para formar uma equipe competitiva, além da troca do comando técnico. Eu, pessoalmente, iria atrás de Mano Menezes, Zé Roberto (encostado no Grêmio), Marcelo Nicácio (excelente atacante do Atlético-PR), Elias (do Flamengo) e procuraria alguém capaz de assumir a lateral esquerda.

*Amplitude: distância entre uma lateral ou outra- jogar em amplitude = “abrir o jogo”.

Profundidade: Distância entre uma linha de fundo e outra- jogar em profundidade = buscar a linha de fundo.

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

As funções dos laterais: um mergulho através das copas.

          Assim como em todas as outras posições, as funções do lateral foram sofrendo ajustes ao longo dos anos, de acordo com mudanças táticas promovidas pelos treinadores.
      Até o fim dos anos 1960 os laterais quase não subiam ao ataque.  Se tanto, chegavam até a intermediária ofensiva, de onde passavam a bola para um meia ou ponta e não subiam mais. Eram basicamente zagueiros pelos lados, compondo uma clara linha de quatro, praticamente imutável durante o jogo.

O ponta Zagallo cobrando lateral próximo a linha de fundo na copa de 1958. Laterais subiam no máximo até a intermediária ofensiva.
         Na copa de 1970, os jogadores conversavam muito entre si, discutindo posições, movimentações e estratégias de jogo, á revelia do técnico Zagallo. Eram atletas inteligentes e que sabiam enxergar e discutir o jogo.
      Tendo em vista o vigor físico de Carlos Alberto Torres e sabendo que os pontas das equipes adversárias não tinham o costume de acompanhar as subidas do lateral (afinal, o lateral ainda pouco subia na época), uma das jogadas combinadas era que Jairizinho buscasse o centro ou até o outro lado do campo, abrindo assim um corredor para a infiltração de Torres. Dentre outras jogadas, saiu assim o último gol da final contra a Itália. Desde então, os laterais começaram, ainda que timidamente a ganhar funções ofensivas, deixando de ser zagueiros pelos lados.

Carlos Alberto Torres sobe para fazer gol sobre a Itália na final da Copa do Mundo de 1970.
         Em 1982, uma seleção espetacular, com jogadores altamente técnicos e que trocavam constantemente de posição. Como contava com muitos meias de qualidade (Falcão, Cerezo, Sócrates e Zico), Telê Santana abriu mão de um ponta, deixando apenas Éder de ponta esquerda e a ponta direita “vazia”, gerando um revezamento de atletas que ocupavam o setor: Falcão, Sócrates e o lateral direito Leandro. Do outro lado, como Éder ficava na ponta, Junior subia por dentro, armando o time juntos aos meias e aparecendo para passar/finalizar (fato que era facilitado por ser destro). Estranhando o desenho tático, criou-se um mantra, exemplificado por um bordão de Jô Soares: “Coloca ponta, Telê!”. O futebol bonito e envolvente ficou na memória, porém a eliminação antes da final embasou o argumento de quem defendia o uso dos pontas.

Júnior subia por dentro, participando ativamente da construção de jogadas ofensivas ao lado dos meias, em 1982.

Na ausência de um ponta direita, Leandro subia até o fundo, revezando-se com Falcão e Sócrates.
        Desde então, tornou-se comum o uso de quatro meias, e os pontas foram se extinguindo. Sendo assim, os responsáveis pela amplitude e profundidade do jogo passaram a ser os laterais, que começaram a subir com maior frequência. Os dois maiores símbolos dessa geração são Roberto Carlos e Cafu. Com vigor físico para chegar á linha de fundo, realizar cruzamentos e ainda voltar para compor a linha defensiva, tornaram-se um parâmetro muito difícil de atingir.

Cafu era figura carimbada no ataque na Copa de 1998. Repare que ele está á frente até do centroavante Ronaldo.
Enquanto Cafu nem aparece na foto, Roberto Carlos faz a cobertura por dentro, posicionando-se praticamente como terceiro zagueiro.
Roberto Carlos também era figura constante nas ações ofensivas da seleção de 1998. Repare que, assim como Cafu, ele também se apresenta á frente do centroavante Ronaldo.
 Começaram a surgir cada vez mais laterais bons no apoio, porém com dificuldades defensivas. A fim de compensar isso, os treinadores passaram a se usar de volantes estritamente marcadores e de terceiros zagueiros. Com isso, permitia-se aos dois laterais subirem simultaneamente e realizar a saída de bola sem se preocupar tanto com obrigações defensivas.
 Na Copa de 2002, Edmilson era o volante/zagueiro, que se posicionava de acordo com o número de atacantes do adversário e dava liberdade para Cafu e Roberto Carlos (ambos sem o vigor físico de outrora) apoiarem o ataque.

O volante/zagueiro Edmilson dava liberdade para que Cafu e Roberto Carlos subissem simultaneamente ao ataque em 2002.
Ultimamente, com laterais bem marcados na saída de bola e volantes com poucos recursos para realizar a função, o uso de três zagueiros saiu de moda, dando lugar a esquemas com volantes de passe qualificado e meias abertos (praticamente os pontas de antigamente). Com isso, os laterais voltaram a ter maiores obrigações defensivas. Os principais times do mundo hoje jogam com uma linha defensiva de quatro jogadores, sendo que ou os laterais apoiam alternadamente (como era no Brasil de 1998), ou o time conta com um lateral-base, que fica basicamente como terceiro zagueiro e um lateral com maior qualidade para atacar. Inclusive é comum improvisar zagueiros na lateral.
 Dentre os exemplos de equipes atuais ou recentes que utilizam um lateral-base e outro mais apoiador temos: o Barcelona de Guardiola (com Abidal mais fixo e Dani Alves com liberdade) e o Atlétco_MG atual campeão da Libertadores (com Junior Cesar- ou Richarlyson- mais fixo e Marcos Rocha com maior liberdade). Na última Copa, a seleção espanhola pouco subia seus laterais, e quando subia normalmente era o Sergio Ramos pela direita. No lado oposto, Capdevilla segurava mais como terceiro zagueiro. No Brasil atual, Dani Alves e Marcelo revezam-se no apoio, compondo a última linha defensiva quando necessário.

Na seleção espanhola campeã do mundo de 2010, Sergio Ramos era o lateral apoiador, enquanto Capdevilla era o lateral-base do lado oposto.

É evidente que não existem regras quanto á formações, estratégias ou desenhos táticos utilizados em cada época. Em todas as épocas temos times ou seleções que jogavam de maneira diferente da tendência. O Blog se apoia justamente nisso, na tendência de cada época para suas conclusões. E não existe uma maneira pior ou melhor de se jogar. Isso depende de uma série de fatores, como atletas disponíveis, preparo físico, filosofia do treinador, objetivos do jogo, entre muitos outros.

segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Gylmar; De Sordi... a Seleção Campeã do Mundo de 58

Os dois primeiros nomes da escalação da seleção campeã do mundo de 1958 (De Sordi foi titular durante toda a campanha, ficando de fora somente da final, por lesão, quando deu lugar a Djalma Santos) faleceram nesse último fim de semana.

Gylmar e De Sordi: integrantes da campanha do título mundial de 58
Quando pequeno, eu gostava de decorar as escalações dos times históricos do Palmeiras e da seleção brasileira. Sabia de cor o time da final de 58 e sempre via matérias ou lia reportagens a respeito do título. Sabia que Pelé e Garrincha viraram titular ao longo da copa, que Zagallo praticamente “inventou”  o 4-3-3,que Didi criou o “folha seca” e que os laterais pouco avançavam na época. Porém não sabia exatamente como jogava o time, coisa que hoje é possível graças ao Youtube. Vi a final entre Brasil e Suécia na integra.
A primeira linha defensiva era formada por Bellini e Orlando no comando da defesa e De Sordi (Djalma Santos na final) e Nilton Santos nas laterais. Quando muito, os laterais subiam até a intermediária ofensiva, de onde tocavam para o ponta ou um dos meias. Na época ainda não faziam ultrapassagens ou entravam na área.

Zagallo cobrando lateral próximo a linha de fundo: quando muito, os laterais subiam até a intermediária ofensiva.
A dupla de meias era Zito e Didi, ambos extremamente técnicos (principalmente o segundo, que tinha grande controle de bola). Marcavam um pouco atrás do círculo central e, com a bola, ocupavam simultaneamente a intermediária ofensiva (o que era possível graças os posicionamento conservador dos laterais), onde procuravam rodar a bola, enfiar para as ultrapassagens de Garrincha ou fazer tabelas com os atacantes.
Os pontas Garrincha e Zagallo tinham posturas e funções diferentes dentro de campo. Zagallo recuava e compunha o meio junto de Zito e Didi, ajudando na marcação e sendo o principal responsável pela saída de bola (não tive acesso aos dados estatísticos do jogo, mas acredito que Zagallo tenha sido o que mais tocou na bola). Grande parte das jogadas saía da esquerda, passava pelo meio e chegada aos pés de Garrincha na ponta oposta, onde ele ia para cima da marcação, procurando as jogadas agudas. Os dois primeiros gols da final, inclusive, saíram de cruzamentos seus para Vavá.

Zagallo (número 7) compondo o meio de campo ao lado de Didi: ajuda na marcação e principal responsável pela saída de bola da equipe.
Muito se diz que Pelé era o ponta de lança, enquanto Vavá era o centroavante da equipe, porém eles formavam uma dupla de ataque. Tinham poucas obrigações defensivas e, quando time tinha a bola, se revezavam entre buscar o jogo fora da área e entrar para finalizar. Fizeram dois gols cada na final, todos como autêntico centroavante.

Pelé e Vavá lado ao lado: sem muitas obrigações defensivas e revezando-se entre buscar a bola e finalizar a jogada.
É possível encontrar nesse jogo muitos aspectos conceituais semelhantes aos que vemos no futebol atual: volantes com bom controle de bola e bom passe, meias pelos lados com funções diferentes (um mais armador e outro mais incisivo), mobilidade (vista no revezamento e funções entre Pelé e Vavá)...

Os homens se vão, vencidos pela idade e pelas doenças, mas os heróis da primeira Copa conquistada pelo Brasil ficam para sempre guardados em memórias, histórias, matérias e vídeos.

Panorama geral da seleção de 58, com laterais sem buscar o fundo, Zagallo compondo o meio de campo, Garrincha mais incisivo e Pelé e Vavá alternando funçòes.

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Os “Camisa 10” ainda existem

              Quando falamos do “autêntico” camisa 10, logo nos vem a imagem, meio utópica, do craque, aquele jogador de classe, que joga com a cabeça em pé, tem habilidade e boa qualidade técnica, organiza o time em campo com passes e palavras e ainda chama a responsabilidade para decidir partidas.

                Difícil achar um jogador que reúna tantas qualidades, mas nesse Campeonato Brasileiro fomos agraciados com quatro atletas que se encaixam no perfil do camisa 10, atletas os quais fazem valer a pena cada centavo gasto no ingresso (sem colocar aqui em discussão o valor dos ingressos- é só forma de expressão): Alex, do Coritiba, Seedorf, do Botafogo, Juninho Pernambucano, do Vasco , e Zé  Roberto, do Grêmio.

Alex, Seedorf, Juninho Pernambucano e Zé Roberto: craques com a bola nos pés, inteligência tática e líderes em sua equipe (detalhe para a faixa de capitão no braço dos quatro).

                  Os dois primeiros estão em maior evidência por se encontrar em equipe melhor organizada e em melhor fase. Vale a ressalva aqui que o craque é tão importante para o time quanto o time é para o craque, ou seja, em times mal organizados, dificilmente um jogador conseguirá desempenhar seu melhor papel.
                Em comum entre eles, além das qualidades citadas acima, a liberdade que têm em campo: pela inteligência tática e capacidade de leitura de jogo, não precisam de funções tão específicas, podem mudar posicionamento e funções de acordo com características do adversário e situação do jogo. São praticamente um segundo treinador em campo. É importante ressaltar que essa liberdade só é possível se o treinador tiver a cabeça aberta para ouvir as opiniões dos atletas e esses jogadores saibam respeitar o comando e deixar a palavra final com o técnico.
                Além da inteligência tática e do espírito de liderança, os quatro atletas citados são extremamente profissionais. Cuidam bem do corpo, não cometem excessos, permitindo que cheguem aos mais de 30 anos em excelente forma física.
                Nesse caso, as imagens valem muito mais que qualquer palavra, então seguem abaixo alguns vídeos ilustrando as qualidades dos atletas citados.





segunda-feira, 1 de julho de 2013

Revelação da Copa das Confederações: Luiz Felipe Scolari


          “Nunca pare de aprender. A vida nunca para de ensinar”.  Os estudos, a tecnologia, a comunicação e as novas idéias fazem com que sempre haja novidades em qualquer ramo. No futebol, não é diferente. Metodologias de treino, conceitos e estratégias de jogo, ocupação do campo e preparação física vão se renovando com o tempo. Os técnicos brasileiros têm sido ultimamente criticados pelo pouco estudo, por manter idéias hoje consideradas arcaicas, e com Felipão não era diferente (inclusive em seu último trabalho realizado, no Palmeiras).
        A atuação brasileira na final da Copa das Confederações foi excepcional, não tanto pelo resultado, mas principalmente pela postura da equipe em campo.
      Aproveitando o apoio da torcida, marcação por pressão e intensidade nos primeiros 20 minutos. Atacantes participando da marcação, volantes ocupando o campo de ataque, defesa alta deixando a equipe compacta. Assim como no Corinthians, Paulinho por muitas vezes se alinhava ao trio de meias, formando praticamente um paredão, dificultando a seleção espanhola de entrar na intermediária ofensiva, sua zona de conforto.
        Após os primeiros 20 minutos, uma pequena diminuição na intensidade, com Paulinho mais próximo de Luiz Gustavo, mas sempre com até nove jogadores ocupando a intermediária, negando espaços e tirando a opção imediata de passe dos meias espanhóis, fazendo com que eles forçassem o jogo e errassem mais que o normal (juntos, Iniesta e Xavi acertaram 90% dos passes, um número ainda considerável, porém a pior média de acertos deles em toda a competição).
        Ofensivamente, muita velocidade. Bolas diagonais longas, procurando principalmente Neymar pra cima de um perdido Arbeloa, tabelas rápidas e muitas ultrapassagens. Fred, o “centroavante de referência”, não se limitou a ficar parado dentro da área, tendo participação na marcação e na mobilidade ofensiva (como, por exemplo, no terceiro gol, quando partiu em diagonal pela esquerda).
        Ao fim do jogo, com o resultado consolidado e a seleção espanhola com um a menos e entregue, duas linhas de quatro bem definidas e as entradas de Jadson e Hernanes, qualificando a troca de passes curtos, valorizando a posse de bola e evitando dessa maneira correr maiores riscos defensivos. Ao final, 48% de posse de bola, quase empatando com a seleção espanhola.
       Jogo vertical e entrega na marcação eram armas conhecidas de Felipão. A novidade fica por conta de uma maior compactação, marcação pressão alta, intensidade e até mesmo a valorização da posse de bola para segurar o resultado. E Paulinho mostra que volante faz gol sim e não é bonito só para a imprensa.
      Podemos dizer sim, que melhorou, que evoluiu, que surpreendeu e que teve uma atuação espetacular, mas ainda há trabalho a ser feito. A evolução deve continuar e Felipão sabe disso. Em nenhum momento da Copa das Confederações o Brasil se viu com o placar adverso: como lidaria com isso, psicológica e taticamente?  Hulk, apesar da aplicação tática e do preparo físico, destoa tecnicamente do resto do time. Para mim, o jogador ideal para realizar essa função (dublê de atacante, meia e volante) dentro da proposta do Felipão é o Ramires.  David Luiz teve atuação soberana na final, porém, assim como Marcelo, é capaz de ações impensadas que podem colocar em risco a seleção (como os pênaltis cometidos por ambos na semi e na final). Por vezes, principalmente no fim dos jogos, a defesa recua em excesso, descompactando um pouco o time. Quando os laterais são bem marcados, a equipe sente dificuldades na saída de bola, sendo necessária uma maior participação dos volantes e meias nesse processo.
       Talvez também contando com a contribuição dos jogadores, que atuam em sua maioria em cubes com técnicos atualizados, talvez com a ajuda de Carlos Alberto Parreira, um estudioso do futebol, Luiz Felipe Scolari mostra que é possível sim se reinventar e aderir a conceitos modernos, sem deixar de lado convicções antigas. Vamos acompanhar seu trabalho até a Copa do Mundo e torcer para que a seleção continue se atualizando e evoluindo.

Pressão na saída de bola espanhola, com participação de Paulinho, o volante que faz gols. 

Bloqueio no meio de campo, dificultando a Espanha de entrar na intermediaria ofensiva, sua zona de conforto.

No fim do jogo, linha de quatro bem definida no meio, porem  linha defensiva recuada em excesso, descompactando a equipe.

Fred participando da mobilidade ofensiva: referencia móvel, dificultando a marcação da equipe adversaria. 

segunda-feira, 13 de maio de 2013

O Atlético-MG de Cuca: Intensidade, Mobilidade e Velocidade


            Alex Fergunson está se aposentando agora após mais de duas décadas no comando do Manchester United, e os clubes brasileiros parecem estar descobrindo agora uma receita simples de sucesso: manutenção do técnico, pequenos ajustes no elenco e tempo e tranqüilidade para colher os frutos do trabalho. Foi assim com o Corinthians de Tite, campeão da Libertadores e do mundo e está sendo assim agora com o Atlético-MG de Cuca, dono do futebol mais vistoso do ano. A continuidade e os pequenos ajustes no bom trabalho do ano passado (o principal deles a contratação de Diego Tardelli) traz resultados que uma reformulação drástica (recurso comum por aqui) dificilmente traria.

O quarteto ofensivo do Galo: qualidade, continuidade, trabalho e entrosamento entre os segredos do sucesso.
            No atual texto irei focar na dinâmica do quarteto ofensivo atleticano (e bota dinâmica nisso). No desenho inicial, temos Ronaldinho na articulação central, Diego Tardelli pela direita, Bernard pela esquerdae Jô na referência. Porém não vemos em campo esse desenho inicial sendo respeitado. Há muita troca de posição e de função durante as partidas, aproveitando a qualidade e o entrosamento dos atletas e indefinindo a marcação da equipe adversária. Jô recua, os atacantes pelos lados fazem diagonais e aparecem como referência, Ronaldinho abre pela esquerda... tudo isso com o apoio principalmente de Marcos Rocha pela direita e de Leandro Donizete pelo meio.
            A impressionante capacidade física de Jô é bastante e muito bem explorada pela equipe, que usa bastante dos lançamentos longos, principalmente de Rever e Leandro Donizete. Cabe aqui uma ressalva: as “quebras” de bola procurando Jô não se dão por falta de recursos ofensivos da equipe, mas sim como uma poderosa arma, muito bem treinada e muito bem articulada.
            Nas fotos abaixo, vemos quatro situações diferentes ocorrendo nos quatro gols do Atlético na partida contra o São Paulo pela Libertadores. Escolhi o mesmo jogo para retratar como em um único hoje a equipe pode usar um grande leque de armas. Reparem como os gols saem de diversos setores do campo: lançamentos longos, jogadas pela direita e jogadas pela esquerda. 
            A imprevisibilidade do futebol não permite cravar o Atlético como campeão da Libertadores ou do Brasileirão, mas é hoje o time que mais encanta e impressiona no Brasil. A velocidade e a intensidade impostas, principalmente em casa, a fome de gols, e tudo isso de maneira muito bem treinada, articulada e executada. Torcemos para ver mais equipes como o Atlético-MG de hoje. 

No primeiro gol: Jô voltou para disputar lançamento pelo alto e ficou na posição do articulador central. Tardelli partindo da direita, Ronaldinho abrindo pela esquerda e Bernard na referência.

No segundo gol, jogada pela direita: time "certo" com Tardelli na direita, Ronaldinho na articulação central , Jô na referência e Bernard na esquerda.

No terceiro gol: Jô volta para ajudar a marcação e deixa Tardelli na referência, aproveitando sua velocidade na transição ofensiva rápida, partindo de uma ligação direta do goleiro Victor.

No terceiro gol, Ronaldinho arranca pela esquerda mostrando seu repertório de dribles, enquanto Tardelli está na referência, Jô na posição do articulador central e Bernard dessa vez pelo lado direito.

sexta-feira, 12 de abril de 2013

Os Países do Futebol são a Espanha e a Alemanha


             Dos quatro classificados para as semi-finais da UCL dois são espanhóis e dois são alemães. Todos disputaram as quartas de final na condição de favorito e venceram. A promessa é de grandes duelos. E a classificação de quatro equipes desses dois países não é pura coincidência ou sorte. É fruto de grandes investimentos e, principalmente, trabalho bem feito.
            A seleção espanhola vem papando títulos importantes desde 2008: já são duas Eurocopas e uma Copa do Mundo nesse período, tendo como base a equipe do Barcelona, reforçada por jogadores importantes do Real Madrid. Já a seleção alemã, apesar de não ter conquistado títulos nesse período, foi vice da Eurocopa de 2008 e semifinalista da Copa do Mundo de 2010 e da Eurocopa de 2012, tendo uma base ainda jovem e promissora, composta principalmente de atletas do Bayern de Munique e do Borusia Dortmound. Não é a toa que essas são justamente as seleções apontadas como grande favoritas da Copa do Mundo de 2014, superando inclusive a Argentina de Messi e o Brasil.
            Em comum entre as equipes: manutenção da filosofia de jogo, manutenção do elenco, contratações/reposições pontuais e a intensidade de jogo proposta. Jurgen Klopp está à frente do Dortmound à 5 anos, Jupp Heynckes comanda o Bayern à dois anos e Mourinho está no Real faz 3 anos.O único “estreante” aqui é Tito Vilanova, do Barcelona, porém deve-se levar em consideração que ele já trabalhava no clube desde 2007 como assistente, ou seja, houve continuidade na filosofia de trabalho.

Manutenção do trabalho: um dos grandes segredos do sucesso dessas equipes.

            Exceção feita ao Barcelona, a proposta de jogo e o desenho tático das três outras equipes é bastante similar: 4-2-3-1 da moda, com intensidade e movimentação em torno da referência. Com a bola, passes verticais e diagonal dos meias pelo lado em busca da rápida finalização da jogada. Uma dupla de volantes com passe qualificado, sendo um que chega mais ao ataque e outro que fica mais contido. Na referência um jogador forte que não só finaliza como também serve.

3 dos 4 semifinalistas têm proposta de jogo semelhante.

            Impossível apontar um favorito dentre os quatro semi-finalistas. Cabe a nós esquentar a pipoca e nos deliciar com a promessa de grandes jogos.
            A receita aqui é simples e básica, não tem nenhum grande segredo: trabalho, filosofia, continuidade, intensidade. Tendo técnicos bem preparados, um bom elenco em mãos, uma filosofia de jogo bem assimilada e um trabalho bem feito ao longo de pelo menos dois ou três anos, os resultados fatalmente surgirão.

sexta-feira, 22 de março de 2013

O São Paulo de Telê Campeão do Mundo de 1992


            Tendo em vista as más atuações recentes do São Paulo e a pressão recaindo sobre o técnico, Ney Franco, além das críticas pelas fracas atuações de Ganso, coloquei-me a pensar sobre como seria escalado o time se o técnico fosse outro. Com isso na cabeça, fui pesquisar como jogava o São Paulo campeão do mundo de 1992, sob a batuta de Telê Santana.
            Cabe ressaltar que a análise atual se baseia em apenas uma partida, sendo assim pode não condizer com a maneira como o time jogava de modo geral na época.

A formação do São Paulo campeão do Mundo de 1992

            A equipe atuava no 4-3-2-1, variável de acordo com o posicionamento e movimentação de Raí e Palinha, os dois meias. Palinha por muitas vezes se alinhava aos volantes, formando uma linha de quatro no meio, enquanto Raí encostava em Muller, formando a dupla de ataque. A marcação era feita quase sempre a partir da linha central do campo, porém com bastante intensidade sempre que o Barcelona ultrapassava a linha, tendo quase sempre oito atletas atrás da linha da bola. A marcação era bem executada e articulada, dificultando o progresso da equipe adversária.

A linha de três volantes e logo à frente os dois meias. Muita intensidade e pouco espaço para a equipe adversária no campo defensivo do São Paulo.

Palhinha retorna formando uma linha de quatro com os volantes, enquanto Raí fica na frente com Muller.

            Com a bola, o São Paulo apostava na transição em velocidade ou no contra-ataque, raramente valorizando a posse de bola. A equipe abusava de bolas longas, principalmente de Palinha e Cerezo, quase sempre procurando Muller, referência de velocidade que não ocupava em hipótese alguma a intermediária ofensiva. Mesmo jogando na referência, Muller não era centroavante, jogando mais pelos lados e abrindo espaço principalmente para Raí, que alternava os papéis de ponta de lança e centroavante.

Situação de contra-ataque: bola longa para Muller (que não retornava nunca para o campo defensivo) e projeção  rápida de Raí e Palhinha, praticamente um 4-3-3.

Muller era referência móvel, alvo dos lançamentos de Cerezo e Palhinha pela esquerda, enquanto Raí muitas vezes se portava como o centroavante da equipe, como na situação que gerou o primeiro gol (diga-se de passagem em jogada espetacular de Muller)

            Quando o time ficava mais com a bola, Cafu, Cerezo e esporadicamente um dos laterais tinham mais liberdade para sair para o jogo, enquanto Pintado ficava mais plantado atrás, junto com os zagueiros e o lateral oposto.
            Não foi necessariamente uma exibição de futebol-arte como a seleção de Telê dos anos 80, porém o sistema defensivo esteve muito bem articulado, marcando de forma intensa e bem organizada. Na frente a velocidade das transições e o fator Raí fizeram a diferença.

O 4-2-3-1 do São Paulo, mutante de acordo com o comportamento de Palhinha, que recuava  formando uma linha de quatro com os volantes e de Raí, que formava uma dupla de ataque com Muller.

            Ganso diz se inspirar em Raí, e realmente tem algumas características semelhantes, como a técnica refinada. Ney Franco poderia se inspirar na maneira que o São Paulo de Telê jogava e deixar Ganso mais à frente, próximo de Luis Fabiano e sem tanta obrigação defensiva, prendendo mais Jadson junto aos volantes qualificando o passe de trás e Oswaldo fazendo uma função semelhante à de Palhinha, voltando para compor a linha do meio de campo sem bola e projetando-se em velocidade com a posse. A maior diferença seria que enquanto Muller era uma referência de velocidade, Luis Fabiano é finalizador, sendo assim Ganso poderia recuar mais para armar com a bola do que Raí fazia.

Caso Ney Franco se inspirasse em Telê Santana: Jadson mais contido perto dos volantes, qualificando a saída de bola, inclusive com lançamentos longos, Oswaldo fechando a linha de quatro no meio e chegando no ataque, Ganso com menos obrigações defensivas e liberdade para armar o time.

sexta-feira, 1 de março de 2013

A Leitura de Jogo e a Tomada de Decisões nas Ações Ofensivas


           O futebol pode ser classificado como uma modalidade esportiva coletiva de ambiente aberto, ou seja, todas as ações realizadas pelos atletas em campo dependem de uma série incontável de fatores, como posicionamento e movimentação dos colegas e adversários, placar do jogo, tamanho e qualidade do campo, entre tanto outros. Diferentemente por exemplo de uma prova de natação, em que o atleta nada dentro da sua raia uma distância pré-determinada sem receber interferências externas.
            No caso do futebol, uma jogada nunca é exatamente igual à outra. Situações de jogo podem ser treinadas à exaustão, porém no momento do jogo nunca sabemos realmente o que acontecerá. Uma movimentação do zagueiro adversário diferente do imaginado já muda totalmente o contexto do jogo. Tendo isso em vista, é fundamental que os atletas sejam treinados para conseguir ler essas situações e tomar decisões em cima disso. A imprevisibilidade é inerente ao jogo.
            Um exemplo básico de situação comum de jogo e as várias opções que o atleta tem no momento: o ponta direita chega à linha de fundo com a bola dominada. Ele pode cruzar na área uma bola alta, rasteira, rasante; no primeiro ou no segundo pau; ele pode tocar para trás; conduzir a bola em direção ao gol; segurar a bola ali esperando a aproximação de um companheiro. Repare como em uma situação simples de jogo o atleta tem diversas possibilidades. A melhor decisão não é uma resposta exata. Tudo depende da movimentação de colegas e defensores, se o time está ganhando ou perdendo, das características dos jogadores... em uma fração de segundos o atleta deve levar tudo isso em consideração na tomada da decisão.
            Cabe ao treinador criar situações e estratégias de treino para instigar nos atletas a capacidade de percepção e criatividade dentro de um modelo de jogo pré-estabelecido. Deve-se sempre ter em mente a pergunta: “qual a melhor opção para a situação que se apresenta agora?”.
            Nas figuras abaixo temos alguns exemplos de jogadas em que os atletas souberam ter leitura de jogo e tiraram proveito disso para o sucesso na execução da jogada. Mesmo em situações pré-estabelecidas e bem assimiladas (por exemplo, passe do Ronaldinho e infiltração do Bernard na diagonal a partir da esquerda) há nuances que são rapidamente percebidos e que geraram a situação de gol.

Repare aqui no sentido da bola e no sentido do Bernard. Percebendo que o zagueiro ia cortar o passe, ele não vai em direção à bola, mas sim na direção do zagueiro, que cortou o passe e praticamente dominou a bola para finalização do Bernard.

Após bola rebatida, Bernard, percebendo que estava em posição de impedimento, recua rapidamente enquanto Jô se projeta para o espaço vazio em posição legal.

Em posição de impedimento, Bernard rapidamente recua para ficar em posição legal e já dispara novamente para dentro da área. Percebendo sua movimentação, Ronaldinho dá o passe no momento certo.

Em uma transição de velocidade, Pato age com calma enquanto o time inteiro do Palmeiras volta o mais rápido possível desordenadamente (entram oito defensores na área e nenhum fica na região da meia lua). Romarinho se projeta no espaço vazio e Pato faz o passe para Romarinho. 

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Prévia dos 4 principais duelos das Oitavas da UCL

        A UCL chega em sua fase decisiva com muitos jogos interessantes. Vou aqui fazer uma prévia de como podem ser taticamente os quatro principais duelos das oitavas: Barcelona X Milan, Real Madrid X Manchester United, Borusia Dortmund X Shaktar Donetsk e Valência X PSG.

        O Barcelona é favorito ante o Milan, mas vale lembrar que na última temporada eles se enfrentaram quatro vezes e, apesar de duas vitórias da equipe catalã e dois empates, foram embates duríssimos. Além disso, o Milan conta com um time melhor que o da última temporada, principalmente com o mais recente reforço: Balotelli.

Milan X Barcelona: promessa de duelos difíceis.
        O Milan deve apostar em um 4-3-3 compacto e forte defensivamente e transições rápidas procurando a velocidade do jovem e renovado trio de ataque nas costas da defesa da equipe catalã, que joga bastante adiantada. No banco, Bojan é opção para renovar o gás ofensivo, e Robinho para cadenciar o jogo.
        O Barcelona não altera sua proposta de jogo: posse de bola, extensa troca de passes e chegada ao gol adversário pelo chão. Muitas ultrapassagens nas duas laterais, na direita Pedro (ou Villa) mais incisivo, na esquerda Fábregas e Iniesta trocando de posição e Messi mais perto do gol, em fase cada vez mais artilheira.        
O desenho tático é o mesmo, mas a filosofia e a proposta de jogo bastante diferentes: Milan mais compacto defensivamente e apostando na transição ofensiva veloz com o jovem trio de ataque. Barcelona apostando na posse de bola, transição pelo chão e fase artilheira de Messi.

        Outro duelo de gigantes opõe Real Madrid e Manchester United, em fases opostas. Enquanto o United, do eterno Sir Alex Ferguson, lidera com folga o campeonato Inglês e conta com o elenco mais forte dos últimos anos, além da boa fase de Rooney e Van Persie, o Real Madrid enfrenta uma grande crise entre o técnico Jose Mourinho e seus atletas, longe do título do campeonato espanhol, má fase de alguns jogadores (como Di Maria e Marcelo) e a lesão de seu líder: o goleiro Casillas.
        
O Real Madrid deverá superar o clima ruim se quiser superar o United, que conta com Rooney e Van Persie em boa fase.

        Como de praxe em jogos importantes, Fergunson deve apostar em uma proposta um pouco mais cautelosa que em jogos pela liga inglesa, mas sem mudar peças ou o desenho tático. Deve atuar em um 4-4-1-1 que muitas vezes pode se formar em um 4-5-1 com Rooney recuando para combater no meio. As jogadas ofensivas acontecem principalmente pelas laterais, com combinações entre o “winger” (meia pelo lado) e o lateral. Rooney atua com liberdade pelo campo, armando e chegando para finalizar, e Van Persie é a referência com excelente faro de gol. Não se pode descartar também a escalação dos experientes Paul Scholes e Ryan Giggs como titulares.                  
             Já o Real deve ficar mais com a bola e pressionar o United. A proposta de jogo é bastante vertical, chegando ao gol com poucas trocas de passe. O desenho é o 4-2-3-1, com a dupla de volantes mais Ozil (o meia central) com boa qualidade no passe e boa chegada na frente. Os meias pelo lado atuam com pé invertido, o que possibilita infiltrações na diagonal. Ronaldo é mais atacante, enquanto Di Maria ajuda a recompor o meio de campo. Não será surpresa a escalação de Essien no lugar de Khedira (ou até mesmo de Di Maria) para vigiar Rooney.
        Ambos os times contam com boas opções no banco para reverter uma situação desfavorável: enquanto o United tem Kagawa, Nani e os dois atletas experientes citados acima, Real tem Marcelo, Modric e Higuain. Promessa de bons jogos, com ligeiro favoritismo para o United levando-se em conta a fase que atravessam os dois times.

Real no 4-2-3-1 bastante vertical deve pressionar o United, que não liga de jogar sem bola e deve apostar em transições ofensivas pelas laterais. Rooney com liberdade para ajudar na armação, marcação e ainda chegar na área para finalizar. 

        Borusia Dortmund e Shaktar Donestk protagonizam o que para mim será o duelo mais interessante e aberto das oitavas de final. Duas equipes com o mesmo desenho tático (4-2-3-1) e proposta de jogo parecida, com transição ofensiva rápida e incursões diagonais dos meias pelos lados.

Borusia: maior tradição e boa fase podem pesar contra o Shaktar, que, sem Willian, deposita suas esperanças nos gols de Mkhitaryan.
        Ambas as equipes contam com uma dupla de volantes com um mais marcador (Kehl e Hubschman) e outro com mais liberdade para encostar nos meias (Gundogan e Fernandinho). O trio de meias promove intensa movimentação e troca de posição em torno do centroavante, com a diferença de que enquanto no Borusia o meia central (Gotze) é mais armador e os meias pelos lados (Blas e Reus) atuam mais como atacantes, sendo mais artilheiros, no Shaktar os meias pelos lados são mais armadores e o principal artilheiro do time é o meia central (Mkhitaryan), que encosta bastante no ataque, praticamente como segundo atacante.
        A tradição e a boa fase do Borusia aliada à saída de Willian, que foi o principal jogador do Shaktar na primeira fase do torneio dão à equipe alemã um ligeiro favoritismo no duelo.
        
Desenho tático e proposta de jogo semelhantes. No Borusia, os meias pelos lados são mais atacantes, já, no Shaktar Mkhitaryan, o meia central, encosta mais no ataque.

        O Paris Saint Germain é apontado como favorito diante do Valência, mais pelo elenco estrelar (Ibrahimovic, Lucas, Lavezzi, Pastore, Thiago Silva, o técnico Carlos Ancelotti e agora David Beckham) que pela proposta de jogo em si. 
Apesar de não ter jogadores de renome, o Valência conta com um bom time e filosofia de jogo bem assimiliada. Ancelotti aposta na compactação defensiva e na qualidade de seus atletas para definir partidas.
           Para encaixar Lucas como titular no time, Ancelotti apostou no desenho tático 4-4-2, com Lavezzi e Pastore adaptados como meias pelos lados nas ações defensivas. A dupla de volantes deve contar com Thiago Motta e Matuidi, mais marcadores, deixando Veratti (que tem melhor passe) no banco. A aposta é na compactação defensiva e ligação direta, procurando a altura e força de Ibra e a velocidade de Lucas pelos lados. Na transição ofensiva, Lavezzi encosta nos atacantes, enquanto Pastore centraliza para armar. Beckham, recém-chegado ao time, deve ficar como opção no banco.
         O Valência, apesar de poucos nomes de expressão, tem um time bem montado e bem articulado. Atua no 4-2-3-1 e deve ficar mais com a bola que a equipe adversária. Os meias pelos lados (Feghouli e Guardado) centralizam para articular o time, enquanto Jonas, o meia central, encosta bastante em Soldado, praticamente como segundo atacante.
        Pelo time em si, pela proposta de jogo bem assimilada pelo elenco e pelo entrosamento, aponto Valência como favorito, mas é inegável que o PSG conta com jogadores capazes de definir o jogo em um ou dois lances.

Valência deve ficar mais com a bola. Os meias pelo lado centralizam para armar, enquanto Jonas encosta em Soldado praticamente como segundo atacante. No PSG, muita marcação e aposta na força de Ibrahimovic e na velocidade de Lucas na ligação direta.