O blog Conceitos Táticos, como o próprio nome entrega, visa abordar os conceitos táticos no mundo do futebol. Meu objetivo é analisar, provocar, fazer pensar, discutir e tirar dúvidas sobre o assunto. Estou sempre aberto a opiniões, sugestões, críticas, perguntas, discordâncias e etc.

sexta-feira, 23 de março de 2012

Conceitos Defensivos: Algumas Considerações Práticas

          No último post os conceitos defensivos da marcação por zona foram abordados de forma puramente teórica. Foi uma introdução para defender algumas considerações que tenho sobre a organização do sistema defensivo de times brasileiros.
          No Palmeiras, discute-se se Daniel Carvalho e Valdivia podem jogar juntos. Scolari prefere jogar com apenas um meia “armador” e escalar ao seu lado um meia “tático” (aquele que não tem grande proficiência técnica porém se esforça e cumpre as determinações do treinador, ajudando os volantes na marcação quando o time está sem bola), já que, para ele, o time fica vulnerável com os dois juntos.

      No Vasco, Juninho e Felipe raramente jogam desde o começo juntos, e quando isso acontece, normalmente é com dois volantes atrás deles. Como são dois meias articuladores, o time sente falta de um ponta de lança, aquele meia que entra na área e chega para finalizar. Vale lembrar que Felipe atuou em grande parte da carreira como lateral (atleta com funções defensivas) e que Juninho fez história no Lyon atuando como segundo volante.

Assim como Juninho, Renato do Botafogo teve seu auge atuando como segundo volante. Atualmente tem jogado nessa posição, porém em muitas partidas ele é adiantado para jogar como meia e mais um volante é colocado em campo.
Nos três casos acima, temos em comum a opção dos técnicos em valorizar a segurança defensiva em detrimento de uma maior vocação ofensiva da equipe.
Sou adepto da idéia de que os melhores devem entrar em campo. Para mim é possível Valdivia e Daniel Carvalho jogarem juntos com “apenas” dois volantes em campo; Juninho e Felipe jogarem juntos, com mais um volante e um meia em campo; e Renato jogar de segundo volante.
Como descrito no post anterior, na marcação por zona há uma divisão equilibrada de espaços e funções, em que cada atleta fica responsável por uma parte, evitando assim o desgaste excessivo de um ou de outro. Não há necessidade do meia acompanhar o volante adversário até dentro da própria área ou sair dando carrinhos e roubando bolas. Cabe ao técnico mostrar a importância do papel de cada um dentro de campo tanto com quanto sem a bola. Um sistema defensivo bem montado pode dar segurança à equipe mesmo sem plantar dois “leões de chácara” na frente da defesa.
No próprio futebol brasileiro temos um exemplo prático de como é possível ter uma defesa consistente mesmo escalando vários atletas com vocação ofensiva: o Corinthians campeão brasileiro de 2011 com a defesa menos vazada da competição (36 gols sofridos). Rápida análise da equipe: um goleiro razoável para bom; dois laterais que marcam, mas que também apóiam o ataque; dois zagueiros bons, porém nenhum “monstro”; dois volantes que estão longe de ser “açougueiros”, Ralf um primeiro volante com qualidade no passe e Paulinho, que aparece bastante no ataque; dois meias e dois atacantes, ou um meia e três atacantes.

A partir dessa rápida análise, podemos perceber que não há nenhuma característica individual que justifique tamanha consistência defensiva. O que acontece é que Tite (um treinador ao meu ver menos valorizado que o merecido) montou um sistema defensivo baseado justamente na cooperação coletiva: sem a bola, todos ajudam na marcação, cada um cumprindo sua função. Tudo isso sem grandes perdas na vocação ofensiva: foi o time com mais vitórias na competição (21) e teve o oitavo melhor ataque (para efeito de comparação: o Palmeiras, com a segunda melhor defesa, conquistou 17 empates- recorde, 11 vitórias e teve o segundo pior ataque, terminando a competição na décima - primeira colocação).
Outro aspecto vigente no futebol do Corinthians que também pode ser considerado de grande importância no sentido de a equipe levar poucos gols: a valorização da posse de bola. A explicação é simples: time que tem a bola não é atacado, logo, não leva gol. Quando um técnico deixa de escalar um atleta de vocação defensiva para escalar um de maior qualidade técnica, aumentam a chance de o time ter maior posse de bola e, com isso, diminui o risco de tomar gol.
Lógico que devemos levar em consideração a dinâmica do futebol, as características do adversário, o calendário de jogos, o estado físico de cada atleta (Valdivia e Daniel Carvalho se lesionam com facilidade e Juninho e Felipe estão em idade avançada, por exemplo), mas com bom planejamento e boa preparação acredito que é perfeitamente possível as escalações como sugerido acima principalmente em partidas importantes.

sexta-feira, 9 de março de 2012

Conceitos Defensivos: Aspectos Teóricos

        Tenho observado algumas situações quanto ao comportamento defensivo de algumas equipes brasileiras com as quais não concordo. Antes de discutir isso, gostaria de definir aqui alguns conceitos defensivos baseados na marcação por zona.
            O princípio básico que norteia a marcação por zona está na distribuição equilibrada e eqüidistante de espaços ocupados por todos os atletas. Com isso, há uma divisão de funções entre os atletas, sem sobrecarregar ninguém e gerando menor desgaste. Além disso, as linhas devem jogar próximas entre si, o que deixa o time compactado e assim dificulta as ações do adversário diminuindo seu espaço.
            Cumprindo esse princípio, a equipe tem grandes chances de conseguir seus três objetivos principais: não tomar gol, evitar a progressão do adversário e roubar a bola. Mas para que isso ocorra, é necessário que todos os atletas da equipe cumpram sua função, executando algumas ações individuais:
           
-Temporização: na marcação 1x1, o principal objetivo do marcador é evitar ser driblado, o que gera um desequilíbrio em todo o sistema defensivo. O atleta deve marcar a uma distância que dificulte o drible e em uma posição que impeça o passe vertical, assim ele atrasa a ação do adversário, obrigando-o a tocar a bola para o lado ou para trás. A temporização também é muito utilizada a fim de evitar o contra-ataque, dando tempo para a equipe se organizar defensivamente.
           
- Balanço defensivo: colocar sempre mais atletas no lado do campo em que a bola está. Exemplo: se a bola está no lado esquerdo da defesa, todos se aproximam mais deste lado do campo, deixando a lateral direita aberta. Em caso de virada de jogo, o balanço deve ser feito rapidamente com o intuito de diminuir os espaços do adversário.
           
- Antecipação: para que a antecipação seja possível, o defensor deve ter leitura de jogo, ou seja, a partir de pistas gestuais oferecidas pelo adversário, perceber o que ele vai fazer e se antecipar ao lance. Com a antecipação, o defensor pode roubar a bola, cortar um passe ou simplesmente impedir o atacante de fazer o que desejava.
           
- Cobertura/troca: quando um atleta é batido, um companheiro da mesma linha ou da linha posterior deve imediatamente fazer a cobertura, realizando o combate sobre o atacante, impedindo-o de ter tempo de pensar o jogo. O atleta batido deve procurar imediatamente ocupar o espaço daquele que fez sua cobertura, mantendo o equilíbrio defensivo da equipe.
           
- Vigilância: o defensor deve ter sempre em vista a bola e os adversários que podem entrar em sua zona de marcação. Quando mais perto do gol, mais de perto deve ser feita essa vigilância.
           
- Marcar a perna boa: priorizar na marcação a perna boa do adversário que está com a bola, dando mais espaço pra ele cortar para a perna ruim. O motivo é óbvio: com a perna ruim, a chance de o adversário acertar um bom passe ou um bom chute é menor.
           
- Posicionar-se entre a bola e o gol: sempre. Quando o adversário está de frente, manter-se de costas para o gol, quando o adversário está na lateral, fechar mais o meio, deixando a lateral mais “livre”.
           
- O atleta que está com a bola SEMPRE deve estar marcado. Além dele, os defensores mais próximos devem fechar as opções de passe imediatas, dificultando assim ao máximo a ação do atleta que está com a bola, restando-lhe as opções de tocar para trás (menor risco) ou efetuar lançamentos (maior chance de erro).

Para que a marcação seja bem executada, é necessário que todos os atletas do time cumpram seus espaços e estejam sempre ligados no jogo e prestando atenção na movimentação da bola, dos adversários e de seus companheiros para tomar suas decisões. A capacidade de pensar o jogo não está inserida apenas nas ações ofensivas, sendo fundamental também nas ações defensivas. Por isso, volto a bater na tecla do primeiro post: é de grande valia ter jogadores que saibam ler e pensar o jogo.