Assim como em todas as outras
posições, as funções do lateral foram sofrendo ajustes ao longo dos anos, de
acordo com mudanças táticas promovidas pelos treinadores.
Até
o fim dos anos 1960 os laterais quase não subiam ao ataque. Se tanto, chegavam até a intermediária
ofensiva, de onde passavam a bola para um meia ou ponta e não subiam mais. Eram
basicamente zagueiros pelos lados, compondo uma clara linha de quatro,
praticamente imutável durante o jogo.
O ponta Zagallo cobrando lateral próximo a linha de fundo na copa de 1958. Laterais subiam no máximo até a intermediária ofensiva. |
Na
copa de 1970, os jogadores conversavam muito entre si, discutindo posições,
movimentações e estratégias de jogo, á revelia do técnico Zagallo. Eram atletas
inteligentes e que sabiam enxergar e discutir o jogo.
Tendo em vista
o vigor físico de Carlos Alberto Torres e sabendo que os pontas das equipes
adversárias não tinham o costume de acompanhar as subidas do lateral (afinal, o
lateral ainda pouco subia na época), uma das jogadas combinadas era que
Jairizinho buscasse o centro ou até o outro lado do campo, abrindo assim um
corredor para a infiltração de Torres. Dentre outras jogadas, saiu assim o
último gol da final contra a Itália. Desde então, os laterais começaram, ainda
que timidamente a ganhar funções ofensivas, deixando de ser zagueiros pelos
lados.
Carlos Alberto Torres sobe para fazer gol sobre a Itália na final da Copa do Mundo de 1970. |
Em
1982, uma seleção espetacular, com jogadores altamente técnicos e que trocavam
constantemente de posição. Como contava com muitos meias de qualidade (Falcão,
Cerezo, Sócrates e Zico), Telê Santana abriu mão de um ponta, deixando apenas Éder
de ponta esquerda e a ponta direita “vazia”, gerando um revezamento de atletas
que ocupavam o setor: Falcão, Sócrates e o lateral direito Leandro. Do outro
lado, como Éder ficava na ponta, Junior subia por dentro, armando o time juntos
aos meias e aparecendo para passar/finalizar (fato que era facilitado por ser
destro). Estranhando o desenho tático, criou-se um mantra, exemplificado por um
bordão de Jô Soares: “Coloca ponta, Telê!”. O futebol bonito e envolvente ficou
na memória, porém a eliminação antes da final embasou o argumento de quem
defendia o uso dos pontas.
Júnior subia por dentro, participando ativamente da construção de jogadas ofensivas ao lado dos meias, em 1982. |
Na ausência de um ponta direita, Leandro subia até o fundo, revezando-se com Falcão e Sócrates. |
Desde
então, tornou-se comum o uso de quatro meias, e os pontas foram se extinguindo.
Sendo assim, os responsáveis pela amplitude e profundidade do jogo passaram a
ser os laterais, que começaram a subir com maior frequência. Os dois maiores
símbolos dessa geração são Roberto Carlos e Cafu. Com vigor físico para chegar
á linha de fundo, realizar cruzamentos e ainda voltar para compor a linha
defensiva, tornaram-se um parâmetro muito difícil de atingir.
Cafu era figura carimbada no ataque na Copa de 1998. Repare que ele está á frente até do centroavante Ronaldo. |
Enquanto Cafu nem aparece na foto, Roberto Carlos faz a cobertura por dentro, posicionando-se praticamente como terceiro zagueiro. |
Roberto Carlos também era figura constante nas ações ofensivas da seleção de 1998. Repare que, assim como Cafu, ele também se apresenta á frente do centroavante Ronaldo. |
Começaram a surgir cada vez mais laterais bons
no apoio, porém com dificuldades defensivas. A fim de compensar isso, os
treinadores passaram a se usar de volantes estritamente marcadores e de
terceiros zagueiros. Com isso, permitia-se aos dois laterais subirem
simultaneamente e realizar a saída de bola sem se preocupar tanto com
obrigações defensivas.
Na Copa de 2002, Edmilson era o
volante/zagueiro, que se posicionava de acordo com o número de atacantes do
adversário e dava liberdade para Cafu e Roberto Carlos (ambos sem o vigor
físico de outrora) apoiarem o ataque.
O volante/zagueiro Edmilson dava liberdade para que Cafu e Roberto Carlos subissem simultaneamente ao ataque em 2002. |
Ultimamente, com
laterais bem marcados na saída de bola e volantes com poucos recursos para
realizar a função, o uso de três zagueiros saiu de moda, dando lugar a esquemas
com volantes de passe qualificado e meias abertos (praticamente os pontas de
antigamente). Com isso, os laterais voltaram a ter maiores obrigações
defensivas. Os principais times do mundo hoje jogam com uma linha defensiva de
quatro jogadores, sendo que ou os laterais apoiam alternadamente (como era no
Brasil de 1998), ou o time conta com um lateral-base, que fica basicamente como
terceiro zagueiro e um lateral com maior qualidade para atacar. Inclusive é
comum improvisar zagueiros na lateral.
Dentre os exemplos de equipes atuais ou
recentes que utilizam um lateral-base e outro mais apoiador temos: o Barcelona
de Guardiola (com Abidal mais fixo e Dani Alves com liberdade) e o Atlétco_MG
atual campeão da Libertadores (com Junior Cesar- ou Richarlyson- mais fixo e Marcos
Rocha com maior liberdade). Na última Copa, a seleção espanhola pouco subia
seus laterais, e quando subia normalmente era o Sergio Ramos pela direita. No
lado oposto, Capdevilla segurava mais como terceiro zagueiro. No Brasil atual,
Dani Alves e Marcelo revezam-se no apoio, compondo a última linha defensiva
quando necessário.
Na seleção espanhola campeã do mundo de 2010, Sergio Ramos era o lateral apoiador, enquanto Capdevilla era o lateral-base do lado oposto. |
É evidente que
não existem regras quanto á formações, estratégias ou desenhos táticos
utilizados em cada época. Em todas as épocas temos times ou seleções que
jogavam de maneira diferente da tendência. O Blog se apoia justamente nisso, na
tendência de cada época para suas conclusões. E não existe uma maneira pior ou
melhor de se jogar. Isso depende de uma série de fatores, como atletas
disponíveis, preparo físico, filosofia do treinador, objetivos do jogo, entre
muitos outros.