No último post os conceitos defensivos da marcação por zona foram abordados de forma puramente teórica. Foi uma introdução para defender algumas considerações que tenho sobre a organização do sistema defensivo de times brasileiros.
No Palmeiras, discute-se se Daniel Carvalho e Valdivia podem jogar juntos. Scolari prefere jogar com apenas um meia “armador” e escalar ao seu lado um meia “tático” (aquele que não tem grande proficiência técnica porém se esforça e cumpre as determinações do treinador, ajudando os volantes na marcação quando o time está sem bola), já que, para ele, o time fica vulnerável com os dois juntos.
No Vasco, Juninho e Felipe raramente jogam desde o começo juntos, e quando isso acontece, normalmente é com dois volantes atrás deles. Como são dois meias articuladores, o time sente falta de um ponta de lança, aquele meia que entra na área e chega para finalizar. Vale lembrar que Felipe atuou em grande parte da carreira como lateral (atleta com funções defensivas) e que Juninho fez história no Lyon atuando como segundo volante.
Assim como Juninho, Renato do Botafogo teve seu auge atuando como segundo volante. Atualmente tem jogado nessa posição, porém em muitas partidas ele é adiantado para jogar como meia e mais um volante é colocado em campo.
Nos três casos acima, temos em comum a opção dos técnicos em valorizar a segurança defensiva em detrimento de uma maior vocação ofensiva da equipe.
Sou adepto da idéia de que os melhores devem entrar em campo. Para mim é possível Valdivia e Daniel Carvalho jogarem juntos com “apenas” dois volantes em campo; Juninho e Felipe jogarem juntos, com mais um volante e um meia em campo; e Renato jogar de segundo volante.
Como descrito no post anterior, na marcação por zona há uma divisão equilibrada de espaços e funções, em que cada atleta fica responsável por uma parte, evitando assim o desgaste excessivo de um ou de outro. Não há necessidade do meia acompanhar o volante adversário até dentro da própria área ou sair dando carrinhos e roubando bolas. Cabe ao técnico mostrar a importância do papel de cada um dentro de campo tanto com quanto sem a bola. Um sistema defensivo bem montado pode dar segurança à equipe mesmo sem plantar dois “leões de chácara” na frente da defesa.
No próprio futebol brasileiro temos um exemplo prático de como é possível ter uma defesa consistente mesmo escalando vários atletas com vocação ofensiva: o Corinthians campeão brasileiro de 2011 com a defesa menos vazada da competição (36 gols sofridos). Rápida análise da equipe: um goleiro razoável para bom; dois laterais que marcam, mas que também apóiam o ataque; dois zagueiros bons, porém nenhum “monstro”; dois volantes que estão longe de ser “açougueiros”, Ralf um primeiro volante com qualidade no passe e Paulinho, que aparece bastante no ataque; dois meias e dois atacantes, ou um meia e três atacantes.
A partir dessa rápida análise, podemos perceber que não há nenhuma característica individual que justifique tamanha consistência defensiva. O que acontece é que Tite (um treinador ao meu ver menos valorizado que o merecido) montou um sistema defensivo baseado justamente na cooperação coletiva: sem a bola, todos ajudam na marcação, cada um cumprindo sua função. Tudo isso sem grandes perdas na vocação ofensiva: foi o time com mais vitórias na competição (21) e teve o oitavo melhor ataque (para efeito de comparação: o Palmeiras, com a segunda melhor defesa, conquistou 17 empates- recorde, 11 vitórias e teve o segundo pior ataque, terminando a competição na décima - primeira colocação).
Outro aspecto vigente no futebol do Corinthians que também pode ser considerado de grande importância no sentido de a equipe levar poucos gols: a valorização da posse de bola. A explicação é simples: time que tem a bola não é atacado, logo, não leva gol. Quando um técnico deixa de escalar um atleta de vocação defensiva para escalar um de maior qualidade técnica, aumentam a chance de o time ter maior posse de bola e, com isso, diminui o risco de tomar gol.
Lógico que devemos levar em consideração a dinâmica do futebol, as características do adversário, o calendário de jogos, o estado físico de cada atleta (Valdivia e Daniel Carvalho se lesionam com facilidade e Juninho e Felipe estão em idade avançada, por exemplo), mas com bom planejamento e boa preparação acredito que é perfeitamente possível as escalações como sugerido acima principalmente em partidas importantes.